Ontem chegou (mais uma)
caixa do Submarino aqui em casa. Na verdade, o objetivo inicial da
compra eram os dois volumes de Coisas Frágeis,
do Neil Gaiman, graças aos constantes arroubos apaixonados da
Patrícia Pirota. Por dezenove caraminhguás, decidi levar. Depois de arrematar os meus, fiquei navegando pela loja (olha o trocadilho infame aí, gente...), afinal
quem é que compra um livrinho só, não é? E, dentre outros
títulos, deparei-me com As avós,
de Doris Lessing. O livro é da Companhia das Letras, de uma coleção de autores que venceram o Nobel. Acho a capa, embora simples, um encanto e gosto muito do tamanho e da disposição das letras nas páginas.
Meu
primeiro contato com a história havia sido por volta de 2008/2009, num passeio
despretensioso pela livraria; comprei-o pelo selinho do Nobel na
capa, confesso, mas meu exemplar já não estava mais comigo por obra
de algum bendito empréstimo (aliás, tenho jurado a mim mesma nunca
mais emprestar livros, pois eles não voltam). Também custava
dezenove realidades no Submarino e lá foi para meu carrinho.
O
que dizer sobre a obra? Primeiro que comecei a leitura dele, mesmo
com outro livro por terminar e desejando loucamente começar os
contos de Gaiman, às duas da manhã de ontem (hoje?) e só larguei às quatro, quando
sorvi, desesperadamente, a última página.
Não
quero colocar aqui a sinopse que está no próprio site do Submarino
(nem quero que você vá ler, por favor...), pois ela conta detalhes
que eu não gostaria de saber
antes da leitura. Por isso, antes de dizer minhas impressões
(nossa, Ana Paula, quem você está pensando que é, hein?), vou
copiar o texto da própria orelha do livro:
“Ao premiar Doris
Lessing com o Prêmio Nobel de Literatura 2007, a Academia Sueca a
definiu como uma 'narradora épica da experiência feminina, que, com
ceticismo, ardor e força visionária, colocou sob escrutínio uma
civilização dividida.' São palavras que (…) poderiam também
resumir, em parte, a trama concisa de As avós.
O
termo 'épico' tem aqui uma conotação mais comedida, centrada menos
em aventuras mirabolantes que nas ressonâncias íntimas da vida das
amigas Roz e Lil – da infância ao início da velhice, passando
pela relação com maridos, filhos, noras e netas. Mas há peripécias
e reviravoltas suficientes nesse caminho: da aparente tranquilidade
inicial, situada num balneário paradisíaco frequentado por ricos,
até a cena derradeira, quando um segredo terrível do passado vem a
público, As avós
é uma longa jornada de confronto das protagonistas com as convenções
familiares e sociais de sua época.
Para
Doris Lessing, essa talvez seja uma das faces inevitáveis da
'experiência feminina' no mundo moderno. Sua 'civilização
dividida' nasce também de uma questão de gênero: mesmo num
ambiente liberal como o descrito nesta novela, é às mulheres que
cabe iniciar, conduzir e dar fim aos atos que ameaçam a ordem
estabelecida. Na visão dessas personagens subversivas,que em alguns
momentos se torna também a visão do leitor, temas como a amizade, a
sexualidade e a maternidade ganham novos contornos, num efeito
ambíguo e desconcertante, típico da grande literatura.”
Sinceramente,
só ao escrever o texto acima já me dá vontade de correr novamente pra
leitura do romance/novela. É daqueles livros para se ler numa única
sentada, pois, além de ser curto (97 páginas), ele te segura preso
na cadeira e só te solta quando acaba, para te deixar com aquela
sensação de abandono de que só os bons livros são capazes. Mas
não pense você que ele foi mesmo embora. Ele vai voltar nos seus
pensamentos de maneira recorrente, quando estiver tomando banho,
preparando o jantar ou conversando com alguém. É como
uma pequena pedra escondida no sapato, que vai continuar incomodando,
mas da qual, por mais estranho que possa parecer, você não vai
querer se livrar.
O
enredo nada mais é do que uma história de amor: do amor entre as
duas amigas, do amor materno, do amor próprio e (principalmente) da
sexualidade. E, embora pudesse ser inverossímil, as personagens
estão tão bem construídas e o texto é de uma sutileza tão grande
que, quando percebemos, já estamos despidos de qualquer preconceito
e torcendo pelas – tantas – histórias de amor.
O
narrador é outro fator que me encanta, pois, apesar de tratar de um
tema e de uma narrativa que, certamente, chocam a sociedade em que
vivemos, ele não realiza qualquer julgamento moral; deixa que nós,
leitores, tomemos a decisão e escolhamos o que, de verdade, é capaz
de nos afetar e qual o tamanho do nosso preconceito.
Além
disso, o romance/novela nos permite pensar em tantos outros assuntos
que chegamos a ficar tontos: como nossos atos geram consequências em
nossas vidas e nas outras pessoas? O que é, afinal, o amor? Qual o
verdadeiro significado da amizade? Qual o papel e a visão da mulher
na sociedade?
Enfim,
mais também não falo, caso contrário estragaria sua leitura, uma
vez que a obra é daquelas em que, quanto menos se souber, melhor.
Apenas digo que indico o livro de olhos fechados (e pensamentos
fervilhando).